Brasília. O vice-presidente da República, Michel Temer (PMDB-SP) afirmou, ontem, que os atritos com o ministro da Casa Civil, Antônio Palocci (PT-SP), "ficaram no passado".
Temer, que está no exercício da Presidência em função da viagem de Dilma Rousseff ao Uruguai, falou aos ministros que a coordenação do governo está fluindo normalmente e que discussões de trabalho não deixam sequelas. Ele evitou a imprensa após a reunião na sede da Vice-Presidência.
Na semana passada, Temer e Palocci tiveram uma grave discussão por telefone. A razão foram as disputas entre PT e PMDB, exacerbadas durante a negociação e votação do Código Florestal na Câmara.
Na tentativa de garantir o apoio do PMDB, que acabou não ocorrendo, Palocci telefonou ao vice e transmitiu ameaça de Dilma, de que demitiria todos os ministros da sigla.
Palocci é coordenador político do governo e pivô de uma crise, depois que a imprensa publicou que o seu patrimônio multiplicou por 20 em quatro anos e que sua empresa faturou R$ 20 milhões em 2010, ano eleitoral.
Na manhã de ontem, Temer encontrou rapidamente Dilma na Base Aérea, antes de ela embarcar para Montevidéu. Eles também participaram da transmissão de cargo.
Irritação
Dilma evitou o contato com a imprensa ontem. Já o ministro das Comunicações, Paulo Bernardo, se irritou ao ser questionado sobre Palocci. "Já que a agenda de vocês é essa, eu não falo. Com licença que vou almoçar", afirmou, ríspido. O ministro, ao tentar sair dos jornalistas, tropeçou em um cabo e quase caiu.
"Volto a repetir o que já disse. Para a Polícia Federal, não há crime, por isso ele não será investigado. Há muita fumaça para pouca fagulha", ressaltou o ministro da Justiça, Eduardo Cardozo. Segundo ele, Palocci não pode divulgar a origem do dinheiro que recebeu em 2010. "Ele pode ser processado pelas empresas se fizer isso. Os contratos de consultoria têm caráter confidencial", afirmou.
Defesa
Palocci entregou na última sexta-feira à Procuradoria-Geral da República suas explicações sobre a multiplicação do seu patrimônio nos últimos anos. No período, o ministro comprou um apartamento de R$ 6,6 milhões e um escritório de R$ 882 mil.
No entanto, antes mesmo de a Procuradoria-Geral da República se manifestar, o Ministério Público Federal em Brasília abriu investigação cível sobre o caso. O foco da ação é apurar se a evolução patrimonial do ministro é compatível com os ganhos da empresa. O advogado de Palocci, José Roberto Batochio, afirmou que a investigação é "ilegal", pois teria sido aberta "com base em boatos".
Após a divulgação de seu enriquecimento, Palocci afirmou, em nota, que o crescimento está detalhado na declaração de Imposto de Renda e que a Projeto prestou serviços a clientes da iniciativa privada, "tendo recolhido sobre a remuneração todos os tributos devidos".
EXPLICAÇÕES
OAB pede afastamento do ministro da Casa Civil
Brasília. O presidente nacional da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), Ophir Cavalcante, defendeu, ontem, o afastamento imediato do ministro da Casa Civil, Antônio Palocci, do cargo. Segundo o presidente da entidade, a medida "soaria muito bem" até que Palocci desse as devidas explicações sobre o crescimento do seu patrimônio nos últimos anos.
Cavalcante criticou a decisão d a Controladoria Geral da União (CGU) de não abrir uma investigação sobre as denúncias. "O pedido de afastamento é algo que soaria muito bem no âmbito da sociedade; é algo que deixaria o governo Dilma muito mais tranquilo", disse.
O presidente da OAB também afirmou ser favorável a uma Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) no Congresso para investigar as suspeitas sobre o ministro da Casa Civil. "A CPI é um instrumento democrático e que está posto para a sociedade na Constituição. De modo que não tenho qualquer dúvida de que a CPI seria algo que poderia ser utilizado", argumentou Cavalcante.
A CGU alegou que Palocci não era "agente público" na época em que recebeu os pagamentos feitos à empresa Projeto Consultoria Financeira e Econômica Ltda., que prestou serviços de consultoria a bancos, montadoras e indústrias. A consultoria foi aberta em 2006, e, em 2010, Palocci mudou o objeto social da empresa, que se transformou em administradora de imóveis.
O afastamento do ministro do cargo já havia sido defendida por membros da oposição na semana passada.
UNIDADE
Sarney minimiza desgaste e afirma que aliança é sólida
Brasília. O presidente do Senado, José Sarney (PMDB-AP), minimizou, ontem, um eventual desgaste na aliança entre PT e PMDB e disse que os partidos têm uma parceria sólida. Sarney afirmou ainda que na democracia é "preciso harmonizar conflitos".
Sarney ressaltou que não foi informado sobre a discussão acalorada entre o vice-presidente Michel Temer (PMDB-SP) e o ministro Antônio Palocci (PT-SP). O motivo do embate foi a votação do Código Florestal na Câmara, na semana passada. "Na política, a democracia é um regime no qual nós precisamos harmonizar os conflitos, mas a sociedade democrática é uma sociedade de conflitos", declarou o senador.
O presidente do Senado afirmou que a aliança dos dois partidos está consolidada, sem ser apenas ocasional e lembrou que ela foi costurada pelo ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT-SP). "Acho que essa aliança é sólida, que foi feita ainda pelo presidente Lula, ele foi o avaliador da aliança, o aproximador e nós o consideramos dentro do PMDB um aliado que nós temos. A presença do presidente Lula na política brasileira é uma coisa da sua liderança nacional, não é uma coisa ocasional de governo", analisou.
José Sarney destacou que o PMDB é independente, mas vai procurar defender que o partido tenha "unidade" com o Palácio do Planalto.
"O PMDB é um partido que tem sempre tido posições independentes. Isso aí o próprio estatuto do partido assegura que os filiados tenham posições independentes. Eu não vou dizer que seja uma unanimidade, mas pelo menos uma unidade o partido vai defender com o governo da presidente Dilma", finalizou Sarney.
Líderes do PT e do PMDB avaliam que o episódio envolvendo Temer e Palocci "deixará sequelas". O governo começa essa semana um esforço para evitar novos desdobramentos para a crise.
Ontem, Temer ofereceu um jantar na sua residência oficial, o Palácio do Jaburu, para os senadores do PMDB. O encontro tem o objetivo de apaziguar os ânimos, já que o texto do novo Código Florestal começa a tramitar nesta semana no Senado, onde o governo pretende modificar o material.
Para Sarney, foi apenas um jantar de rotina. "O Michel, como é vice-presidente e presidente do PMDB, tem essa função de sempre estar presente e procurar a unidade do partido. Esses jantares têm sido coisas rotineiras dentro da nossa convivência", declarou.